Chegou minha vez de ranhetar sobre o sobre

Esta semana foi puxada. Muito. Bagarai.
Quinta-feira, devia ser mais de onze da noite, eu estava revisando um arquivo e fui obrigada a ler num diálogo:

Não tem nada interessante pra eu escrever sobre?

Juro juradinho de pé junto que li isso numa tradução feita por pessoa humana (teoricamente, pelo menos).

Por curiosidade, coloquei a frase em inglês na ModernMT, e a tradução que ela sugeriu foi:

Não há nada interessante para eu escrever?

Está meio dura pra um diálogo? Sim, com certeza. MTs em geral não são lá uma brastemp em diálogos (mas em textos mais quadradinhos nadam de braçada) e, apesar de a ModernMT ser melhor que o GT, por exemplo, porque ela aprende seu estilo segmento a segmento e vai ficando cada vez mais redondinha, parecida com a forma como você traduz do zero, eu não entregaria essa sugestão dela sem fazer alterações. MAS ELA NÃO DEIXOU O SOBRE PENDURADO NO FIM DA FRASE.

Esse sobre sobrando sozinho e abandonado ali no fim é óbvia contaminação do inglês. Na boca (e nos dedos) de quem simplesmente entende inglês, é comum e perfeitamente compreensível. Na boca e nos dedos de linguistas que vivem de traduzir, é horrendo. Pra mim, imperdoável. Quem teve aula comigo em algum momento já me viu distribuindo bronca por causa disso.

Não estou de modo algum sendo purista, tentando defender a Última Flor do Lácio. Toda língua evolui com o tempo, e isso é perfeitamente normal, ou ainda estaríamos nos tratando por Vossa Mercê. Aqui mesmo é raro eu escrever um texto inteiro no registro formal e certinho da tal norma culta. Mas esse caso (e outros parecidos) não é bem a mesma coisa. É sinal de que a pessoa não separa uma gramática da outra. Ela pensa num idioma com as estruturas gramaticais da outra. Mas olha só… clientes pagam a gente justamente porque (em tese) sabemos essas diferenças. É nossa obrigação saber português muito melhor do que outros idiomas. Conhecer a fundo, mesmo. Estudar, fazer cursos. É pra isso que nos pagam.

Como eu demonstrei ali em cima, MT não comete esse erro. Essa MT aí, especificamente, não é gratuita, mas custa muito menos que qualquer profissional da tradução (pago $25 por mês). Se não queremos ser substituídas por elas, precisamos ser melhores que elas. Na pior das hipóteses, iguais (mas não aconselho). Quem está lá na frente da fila pra serem trocadas pelas máquinas são as pessoas que traduzem pior que as máquinas. Logo atrás estão as que traduzem igual. ¯\_(ツ)_/¯

Aliás, devo falar mais da integração da ModernMT com o memoQ nos próximos dias.

Gramática: os porquês

Hoje estava ajudando minha filha de 10 anos a estudar português. Pronomes e os porquês. E comprovei, mais uma vez, que a melhor maneira de aprender é “destrinchar” o assunto para poder explicar para outra pessoa. No meu caso, destrinchar bem destrinchado, para que uma criança possa entender.

A Gramática Nova, de Faraco, Moura e Maruxo Jr., até agora tem se mostrado digna do valor pago por ela: segue o Acordo Ortográfico, traz textos de apoio atuais (quadrinhos, letras de músicas, conteúdo de sites) e explicações bastante claras, imprescindíveis numa gramática escolar.

Resolvi transcrever, aqui, os textos referentes aos porquês, coisa que até adultos costumam errar com frequência. Estas explicações nem de longe são completas, mas espero que possam ajudar a entender melhor os porquês dos textos.

Por que

Usa-se por que nas interrogativas diretas e indiretas. Pode ser substituído por por que motivo.

Por que você a ignora?

Quero saber por que você a ignora.

Os cientistas ainda não conseguem explicar por que os humanos têm tão poucos genes.

Por que equivale também a pelo qual, pela qual, pelos quais, pelas quais.

Esta é a casa por que passamos.

Porque

Porque introduz uma causa ou explicação. Pode ser substituído por pois ou pelo fato de que.

Ele a ignora porque é medíocre.

Não fique preocupada, porque ele está bem preparado.

Por quê

Por quê é empregado em final de frase e quando a expressão estiver isolada.

Ele saiu da sala por quê?

Não vou viajar mais.

Por quê?

Porquê

Porquê é um substantivo. Equivale a causa, motivo, razão. Geralmente é precedido por artigo.

Não me interessa o porquê de sua atitude.

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